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14/10/2013Noticias, São Paulo

Alvenaria estrutural em pauta

Entrevista com engenheira da ABCP mostra  evolução da alvenaria estrutural com blocos de concreto no Brasil

O ato de sobrepor blocos (alvenaria) para construir edificações é milenar, e ao longo dos anos a engenharia evoluiu e atualmente uma das tecnologias mais vantajosas e com melhor desempenho tem sido a alvenaria estrutural com blocos de concreto. Muitas construtoras optam por este sistema porque, além de gerar maior economia, diminui o volume de resíduos gerado na obra, assim como o consumo de materiais, como madeira, aço e revestimento.

Capacitação – No Brasil, a utilização da alvenaria estrutural com blocos de concreto já é bastante expressiva. A demanda por esse sistema também pode ser notada nos cursos de capacitação da ABCP, pois o tema alvenaria estrutural é um dos mais procurados pelo mercado. As vagas para o Curso Básico de Alvenaria Estrutural com Blocos de Concreto, que acontece nos dias 29 de 30 de outubro, já estão praticamente preenchidas.

Acompanhe a entrevista com a engenheira da área de Edificações da Associação Brasileira de Cimento Portland (ABCP) Michelli Silvestre e entenda essa evolução.

 

ABCP – O Brasil e os Estados Unidos são dois dos países que mais utilizam o sistema de alvenaria estrutural. Como foi essa evolução no Brasil e quais os critérios de comparação entre os dois países?

Michelli Silvestre: O uso da alvenaria estrutural teve início no Brasil no início da década de 60, com alguns casos de pouco sucesso. Na década de 70 foram iniciadas pesquisas no IPT e na USP. No final dos anos 80 e início dos anos 90 o sistema construtivo ganhou força e as parcerias universidade / empresa permitiram a criação de materiais e equipamentos nacionais para produção da alvenaria. A partir daí, a alvenaria estrutural passou a ser dimensionada a partir de conceitos técnicos e detalhada de forma racional. Aliada aos estudos acadêmicos, a atuação da cadeia produtiva, destacando-se as atividades desenvolvidas pela ABCP e pela BlocoBrasil, levou capacitação aos fabricantes de blocos e aos profissionais das construtoras, melhorando o desempenho do sistema construtivo como um todo. Assim, com o envolvimento de pesquisadores, projetistas, associações, construtores e fornecedores presenciamos hoje uma indústria de alvenaria em avançado grau de desenvolvimento. Hoje o sistema é amplamente utilizado em todas as regiões do Brasil e é um ramo reconhecido da Engenharia, fazendo parte da grade curricular de grande parte das faculdades.

Nos Estados Unidos, os resultados de ensaios realizados na década de 60 levaram à publicação de regras para dimensionamento de alvenaria não armada pelo Brick Institute of America e pelo National Concrete Mansory Association. Em 1978 e 1988 foram publicadas novas normas de projeto e execução, que evoluíram para as normas produzidas hoje pelo Mansory Standards Joint Committee, geralmente revistas a cada três anos. Assim, percebe-se que a atuação da cadeia, a realização de pesquisas e ensaios e a criação de normas técnicas específicas tiveram um papel fundamental para o desenvolvimento do sistema nos dois países. (Fonte: PARSEKIAN, G. A.; HAMID, A. A.; DRYSDALE, R. G. Comportamento e dimensionamento de alvenaria estrutural. São Carlos: EdUFSCAR, 2012.)

 

ABCP – Em quais tipos de construção o sistema é mais utilizado? Há limite de número de pavimentos?

Michelli Silvestre: A alvenaria estrutural pode ser utilizada para a construção de casas e edifícios residenciais e comerciais. No Brasil, seu uso mais comum é nas construções residenciais, mas também é largamente empregada nas comerciais. Para que o sistema seja competitivo, é necessário atentar para determinadas características da edificação a ser construída. A seguir, duas características que devem ser levadas em conta para definir o sistema construtivo mais adequado:

1ª – Altura da edificação: A viabilidade de uma obra em Alvenaria Estrutural é oriunda basicamente da altura da edificação e de sua arquitetura. Atualmente, são erguidas com sucesso torres com alturas equivalentes a 22 andares ou mais, sendo que o Brasil é referência mundial em edifícios altos neste sistema. A maior economia, no entanto, em geral é obtida em edificações com até 15 pavimentos. Quando a altura da edificação ultrapassa esse patamar de andares, as tensões de compressão chegam a triplicar na base do prédio devido às ações do vento na estrutura, fazendo com que haja a necessidade de grautear grande parte dos blocos na base do edifício. Nesses casos, o empreendimento pode ser inviável economicamente e um estudo de viabilidade é sempre recomendado.

2ª – Arranjo arquitetônico: É um fator preponderante para o sucesso de um projeto em Alvenaria Estrutural. As paredes devem estar sempre alinhadas para que a distribuição de cargas seja uniforme. Também é importante considerar a densidade de paredes estruturais por m² de parede. Preferencialmente, a densidade deve estar na faixa de 0,5 a 0,7 metros de paredes estruturais por m² de pavimento, pois densidades diferentes implicam em blocos absorvendo esforços das lajes, necessitando de maior resistência, o que pode levar à inviabilidade construtiva um prédio de vários pavimentos.

 

ABCP – Como a tecnologia tem se desenvolvido nos últimos anos? Quais os principais avanços tecnológicos?

Michelli Silvestre: No Brasil, a Alvenaria Estrutural começou a se desenvolver a partir da década de 60. Nessa época foi construído o primeiro conjunto de edifícios em blocos estruturais de concreto: o Central Parque Lapa, em São Paulo, composto por 4 prédios com 12 andares cada. Em 1977 foram construídos os primeiros edifícios em Alvenaria não armada, com nove andares. Tentando adaptar a tecnologia importada à realidade brasileira, o processo de nacionalização do sistema construtivo não foi muito bem sucedido na época, com muitos casos de patologias ocasionadas pela má qualidade dos materiais disponíveis, fazendo com que a utilização da Alvenaria Estrutural decaísse até a década de 90. A partir de 1990 houve uma crescente conscientização de que era possível aperfeiçoar a Alvenaria Estrutural aperfeiçoando as técnicas construtivas e o cálculo estrutural, buscando conseguir um perfeito resultado final para a obra, com redução de custos. Foram realizadas várias pesquisas no sentido de unir a tecnologia de blocos de concreto (norte-americana) com a filosofia da alvenaria não armada (europeia), fruto dos esforços do Centro de Pesquisas e Desenvolvimento da Construção Civil da Escola Politécnica da USP, na época coordenado pelo Prof. Dr. Fernando Henrique Sabbatini, que realizou pesquisas para várias empresas, como Tebas, Lix da Cunha e Encol. O trabalho com a Encol, com as consultorias da Tecsof (São Carlos) e Wendler Projetos (Campinas) na área de estruturas resultou em um método construtivo em alvenaria não armada para até 8 pavimentos, posteriormente estendido para até 10 pavimentos. No Brasil, o sistema construtivo em Alvenaria Estrutural tem experimentado um grande impulso e algumas pesquisas investigam alternativas para utilização de novos materiais. Graças à economia que proporciona e à quantidade de fornecedores, a Alvenaria não armada de blocos vazados de concreto é um mercado promissor.

 

ABCP – Os blocos de concreto são responsáveis pela estrutura da edificação. Qual a evolução tecnológica desse material nos últimos anos?

Michelli Silvestre: Para que a alvenaria estrutural cumpra as funções desejadas de desempenho estrutural, conforto termo acústico, vedação e durabilidade, é fundamental que os materiais sejam especificados corretamente e a execução seja bem feita. Em relação aos materiais, os principais insumos que compõem a alvenaria estrutural são: os blocos estruturais de concreto, a argamassa de assentamento e o graute. E, nesse sistema construtivo, o bloco de concreto é a opção preferida dos projetistas, pois:

  • o concreto utilizado na fabricação do bloco possui um módulo de elasticidade similar ao da junta de argamassa, aproximando a resistência da alvenaria à do bloco;
  • a geometria dos blocos de concreto (formato, conicidade dos furos, espessura das paredes) melhora a performance das alvenarias à compressão.

 

ABCP – Há tipos de blocos para edifícios mais baixos ou mais altos? Eles diferem de acordo com o tipo de obra?

Michelli Silvestre: A classificação dos blocos segundo a NBR 6136:2007 é a seguinte:

  • Classe A (fbk > 6 MPa): Com função estrutural, para uso em elementos de alvenaria acima ou abaixo do nível do solo;
  • Classe B (fbk > 4 MPa): Com função estrutural, para uso em elementos acima do nível do solo;
  • Classe C (fbk > 3 MPa): Com função estrutural, para uso em elementos acima do nível do solo;
  • Classe D (fbk > 2 MPa): Sem função estrutural, para uso em elementos de alvenaria acima do nível do solo.

De acordo com o livro “Parâmetros de projeto de alvenaria estrutural com blocos de concreto”, elaborado por um grupo de projetistas e coordenado pelo Prof. Dr. Guilherme Aris Parsekian no âmbito da Comunidade da Construção, a espessura mínima para uma parede estrutural é de 14 cm, sendo possível uma flexibilização para edificações com até dois pavimentos. Nesse caso, o índice de esbeltez (L), que é a relação entre a altura efetiva (hef) e a espessura efetiva (hef), para o caso de alvenaria não armada deve respeitar os seguintes limites:

  • (hef / tef) ≤ 24 para alvenaria não armada;
  • (hef / tef) ≤ 30 para alvenaria armada.

Outros estudos da Comunidade da Construção recomendam que os blocos com função estrutural classe C sejam empregados, conforme sua designação, da seguinte forma:

  • Blocos M10 – edificações de no máximo 1 pavimento;
  • Blocos M12,5 – edificações de no máximo 2 pavimentos;
  • Blocos M15 e M20 – edificações maiores.

De qualquer forma, os blocos devem ser sempre definidos pelo projetista estrutural que, a partir de métodos de cálculo adequados, pode determinar com precisão a espessura e a resistência de blocos ideais para cada obra.

 

ABCP – Quais as principais vantagens do sistema?

Michelli  Silvestre: Os aspectos técnicos e econômicos mais importantes da Alvenaria Estrutural são:

  • Facilidade de controle com um sistema que possui normas ABNT para projetos, materiais e execução definindo claramente os requisitos e critérios necessários para o bom desempenho do sistema.
  • Técnica executiva simplificada com blocos modulares e diversos equipamentos adaptados para tornar a execução mais fácil, prática e produtiva.
  • Facilidade de treinamento e profissionalização com etapas de execução similares à tradicional técnica de execução de paredes. Assim, a mão de obra assimila rapidamente as boas práticas construtivas.
  • Redução do volume de revestimento (argamassa) devido à uniformidade e regularidade nas suas geometrias.
  • Assentamento de revestimento cerâmico interno sobre o bloco de concreto com o uso de blocos de concreto de qualidade e controle na execução da alvenaria.
  • Redução do desperdício de material com a Alvenaria Estrutural facilmente integrada a outros subsistemas. As instalações elétricas e hidráulicas, por exemplo, podem ser embutidas nos vazios dos blocos, sem rasgos ou aberturas para a execução. Como as instalações são realizadas simultaneamente com a elevação das paredes, elimina-se a possibilidade de improvisações que encarecem significativamente a construção.
  • Otimização de mão de obra, não sendo necessários carpinteiros e armadores para execução de pilares e vigas. No Sistema de Alvenaria Estrutural, as barras de aço são colocadas pelos próprios pedreiros.

 

ABCP – O custo é competitivo? Qual a redução de custo comparado a outros sistemas construtivos?

Michelli  Silvestre: A alvenaria estrutural é um processo construtivo consolidado, que pode ser utilizado em qualquer tipo de empreendimento com grande economia. O Sistema de Alvenaria Estrutural permite uma integração entre projeto e execução e integração com outros subsistemas, proporcionando diversas vantagens e gerando uma economia que pode chegar a 20% do custo total da obra em comparação com os sistemas tradicionais.

 

ABCP – É possível realizar projetos arquitetônicos diferenciados utilizando blocos de concreto?

Michelli  Silvestre: A alvenaria estrutural é um sistema construtivo racionalizado. E, para que na obra se obtenha a redução de custo, otimização no tempo da execução e rendimento desejado, é muito importante que um bom projeto seja desenvolvido. O desenvolvimento de projetos em alvenaria estrutural exige procedimentos distintos. Uma das premissas é a necessidade de compatibilização dos projetos arquitetônico, estrutural, elétrico, hidrossanitário e de prevenção de incêndio para definição dos projetos executivos. Nesse sentido, é importante que esses projetos sejam desenvolvidos conjuntamente. Assim como no sistema convencional de concreto estrutural não é possível modificar pilares e vigas, no sistema de alvenaria estrutural também não é possível modificar paredes estruturais, mas isso não significa que o projeto não tenha flexibilidade de layout. Os projetos flexíveis são quase que obrigatórios para atender as necessidades do mercado imobiliário e facilitar a venda do empreendimento, e atualmente é muito comum encontrar apartamentos à venda com diferentes opções de planta. Na alvenaria estrutural, o remanejamento da planta só é possível se o projeto for pensado para isso. Uma das alternativas é utilizar algumas paredes não estruturais. Dependendo da configuração e características do projeto, é possível até ter todas as paredes internas não estruturais. Vale ressaltar que esta alternativa flexibiliza o layout, mas encarece o sistema, e por isso deve ser analisada de maneira criteriosa. Assim, ao optar pelo processo construtivo de alvenaria estrutural, deve-se preparar o projeto desde a concepção da edificação, otimizando as vantagens do sistema. Além disso, a interação entre os profissionais envolvidos, como arquitetos, engenheiros estruturais, engenheiros de instalações, construtores e equipe de vendas, é muito importante para assegurar que as necessidades do mercado serão atendidas.

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