Cimento na Mídia

07/07/2025Cimento na Mídia, IMPRENSA

Como a indústria brasileira de cimento pode reduzir as emissões?

Matéria por João Monteiro

Estima-se que a indústria do cimento represente cerca de 7 a 8% das emissões globais de CO2. O principal vilão é o clínquer – principal componente do cimento portland – sozinho responde por mais de 90% dessas emissões dentro do processo industrial. A maior parte dela (cerca de 60 a 65%) vem da reação química a temperaturas acima de 1400ºC que transformam o calcário em cal para formar os silicatos que compõem o clínquer.

A principal medida para reduzir as emissões dessa indústria é a redução do clínquer, tarefa difícil já que a substância é o “coração” do cimento Portland – suas propriedades determinam as características de resistência, tempo de pega e durabilidade do material. Atualmente, o volume do clínquer no cimento está em torno de 80% (na média global) e varia de acordo com o tipo do cimento.

A indústria brasileira já trabalha abaixo da média global, com 70% de clíquer no cimento, como aponta Vanderley John, professor titular da Universidade de São Paulo (USP). O desafio que ele propõe para o mercado nacional é baixar esse volume para 50%, o que ele coloca como um desafio tecnológico. “Para atingir essa média, será necessário desenvolver cimentos com 20 a 30% de clínquer”, diz John, que também é coordenador do Hubic, centro de inovação da Escola Politécnica da USP em parceria com a Associação Brasileira de Cimento Portland (ABCP).

Como reduzir o clínquer do cimento

A indústria cimenteira tem diversas estratégias para diminuir o uso do clínquer, substituindo-o por materiais cimentícios suplementares, sendo os mais comuns são argila calcinada (LC³) e o filler calcário. A escória da indústria siderúrgica e as cinzas volantes (subproduto de usinas termoelétricas a carvão) também são alternativas, mas dependem da disponibilidade de produção próxima às fabricantes de cimento.

A argila calcinada é usada para diminuir a poluição gerada na reação química do clínquer, bem como diminuir o uso da substância no produto final já que a fórmula da LC³ também usa filler calcário. Mas há ressalvas, como alerta John, pois ela exige maior tempo de endurecimento, o que afasta seu uso na indústria da construção pesada, enquanto no mercado consumidor há certo receio pois o cimento com argila calcinada tende a ficar avermelhado.

O custo de produção também é um fator que pesa contra a LC³, pois a fabricante de cimento precisa utilizar outros fornos para produção da argila calcinada. “Significa que o forno que eu estou operando aqui (para a LC³), que pode ser que já não esteja 100% ocupado (para produção do clínquer), vai ser menos ocupado ainda. Então, do ponto de vista de CapEx, acaba sendo problemático.”

John afirma que o Brasil já usa essa alternativa há pelo menos 60 anos. “Nós fazemos o uso da argila calcinada desde os anos 1960. É o único país do mundo que tem essa experiência. Ela é uma tecnologia que tem algumas aplicações, mas ela tem muitos limites. Eu acredito que a gente pode ir muito mais longe com o filler calcário do que a gente tem ido.”

Filler calcário como opção ao clínquer do cimento

A aposta no filler calcário se dá pela sua capacidade de conceder volume à massa do cimento. O professor explica que ele consegue substituir parte da função do clínquer de preencher os espaços entre os grãos de areia, reduzindo então a quantidade da substância poluidora na composição do cimento.

Hoje, John estima que 16% do cimento brasileiro já usa o filler calcário, sendo que alguns poucos fabricantes trabalham com produtos com até 25% de filler na composição. “Eu tenho uma proposta para a indústria trazer um cimento voltado para o mercado de varejo com 30 a 35% de filler”, diz, baseando a proposta em um caso de uso que não precisa de um produto com tanta resistência mecânica.

O professor defende que dá para ir além. “Se fizer um investimento industrial em moagem separada, mudando a produção da fábrica, talvez consiga ir a 40%. Se eu colocar aditivos, que é o que estamos desenvolvendo (no Hubic), poderia ir talvez a 60% de filler no cimento comercial para o setor industrial. Para a indústria pesada com alta resistência inicial.”

Coprocessamento: a aposta da indústria brasileira de cimento para reduzir as emissões de CO2

Gonzalo Visedo, líder de Sustentabilidade e Meio Ambiente do Sindicato Nacional da Indústria do Cimento (SNIC), afirma que o Brasil é um dos líderes na descarbonização da indústria cimenteira desde 1990. A aposta está no uso de combustíveis alternativos ao coque de petróleo para aquecer os forno, processo chamado de coprocessamento. Segundo dados da ABCP de 2023, 32% da matriz energética do setor era composta por ele, sendo 18% biomassa e 14% resíduos.

A iniciativa ajuda a reduzir a pegada de carbono porque o coprocessamento emite menos CO2 que a queima de combustíveis fósseis, ao mesmo tempo em que evita que o resíduo urbano emite gases ainda mais poluentes com a sua decomposição natural, como o metano, até 30 vezes mais poluente que o dióxido de carbono.

Visedo diz que a indústria nacional conseguiu antecipar em cinco anos o índice de 30% de consumo energético alternativo. “O roadmap proposto pela ABCP era chegar em 30% em 2025, número que foi alcançado ainda em 2020. Agora estamos revisando nossas metas porque tínhamos definido alcançar 35% em 2030 e já estamos em 32%”, diz ele, que aponta a meta de alcançar zero emissões (net zero) até 2050.

Desafio logístico para descarbonização do cimento

O desafio para a indústria brasileira do cimento alcançar a meta é logístico. Visedo diz que o produto tem baixo valor agregado e é muito suscetível ao custo do transporte. Portanto, cabe às indústrias encontrarem fornecedores perto de suas fábricas, o que limita as opções tanto para o coprocessamento quanto para a redução do clínquer.

Na Região Sul, por exemplo, uma das opções é o uso da palha do arroz como biomassa, enquanto o Norte usa o caroço do açaí. Fábricas próximas a centros urbanos já apostam mais no uso de resíduos domésticos, que precisam ser separados para a finalidade do coprocessamento. “Neste caso, as empresas fazem consórcios municipais para ter o volume necessário e a gestão de resíduos para ter o beneficiamento do coprocessamento.”

A estratégia é parecida para a redução do clínquer, segundo o executivo do SNIC, então as fábricas de cimento buscam o que está perto, por isso a dificuldade do uso da escória siderúrgica e de cinzas volantes. “No momento em que elas se tornem mais escassas, a gente consegue imprimir uma velocidade menor (para a redução do clínquer.”

O que a indústria brasileira de cimento já está fazendo para reduzir emissões

Individualmente, cada fabricante de cimento tem sua própria estratégia para reduzir suas emissões. A Votorantim Cimentos, por exemplo, fechou 2024 com o índice global de 32% de coprocessamento, enquanto sua operação brasileira alcançou 35%. “A nossa meta é chegar em 53% até 2030”, disse Álvaro Lorenz, diretor global de Sustentabilidade e Desenvolvimento de Produto da empresa, durante o 9º Congresso Brasileiro do Cimento (CBCi).

A empresa também busca diminuir o clínquer na composição de seu cimento. “Nosso fator clínquer cimento fechou com 72 (em 2024) e a nossa meta é chegar em 68 (em 2030). Então, a gente tem nosso World Map 2030, que foi criado em 2020 e a gente segue a cada ano avançando um pouquinho nos 10 países que estamos presentes.”

Matéria publicada em InfraRoi.

 

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