Vendas de cimento fecham 2024 em alta
As vendas de cimento em dezembro somaram 4,7 milhões de toneladas, um crescimento de 2,8% em relação ao mesmo mês de 2023, de acordo com o Sindicato Nacional da Indústria de Cimento (SNIC). Com esse resultado, o setor termina o ano de 2024 com um total de 64,7 milhões de toneladas de cimento vendidas, um aumento de 3,9%, ou seja, 2,4 milhões de toneladas a mais sobre o ano anterior.
A atividade voltou a crescer após registrar quedas anuais consecutivas, -2,8% em 2022 e -0,89%, em 2023. O resultado recupera as perdas dos últimos dois anos, mas ainda longe do consumo recorde de 2014, de 73 milhões de toneladas.
O desempenho positivo é atribuído à melhora contínua do mercado de trabalho e renda da população, com a massa salarial atingindo o recorde da série histórica. Além disso, o mercado imobiliário, importante indutor no consumo de cimento, seguiu em expansão a partir do segundo trimestre, puxado pela retomada das obras do programa Minha Casa, Minha Vida. No acumulado até setembro, as unidades enquadradas no programa cresceram 58,7% nos lançamentos e 43,6% nas vendas de imóveis no País.
No entanto, apesar da demanda aquecida da construção civil, o setor enfrentou desafios significativos, com aumento nos custos com mão de obra aliado às taxas de juros, endividamento e inadimplência em níveis elevados.
A escassez de mão de obra e o alto custo de contratação já tem elevado salários, pressionando a inflação, com reflexos nos preços dos imóveis e na alta do Índice Nacional de Custo da Construção – INCC.
Já o ciclo de alta da Selic iniciado em setembro acirrou a competição entre os ativos financeiros e os imobiliários, além de tornar o financiamento mais oneroso para o tomador de empréstimo, impactando diretamente o mercado.
As mudanças no financiamento habitacional dificultaram também os novos empréstimos. Os recursos disponíveis para financiamento pelo Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo, cada vez mais restritos, reforçaram a necessidade de buscar outras formas de funding para o crédito imobiliário, que possam atender à crescente demanda por habitação.
Apesar da recuperação do mercado de trabalho com a redução do desemprego e a alta nos salários, o endividamento da população permaneceu alto durante o ano, atingindo 47,98% em setembro. A inadimplência chegou no recorde da série histórica em outubro, com 73,1 milhões de indivíduos inadimplentes. A nova mudança no perfil de consumo da população, com a incorporação das apostas on-line, impactaram o orçamento das famílias e o consumo de cimento.
As condições climáticas extremas enfrentadas ao longo do ano, com temperaturas e chuvas acima da média, como a tragédia ambiental no Rio Grande do Sul e seca em algumas regiões do país, refletiram na comercialização do cimento e comprometeram os cronogramas das obras.
Os baixos investimentos em infraestrutura também impactaram o setor. O PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) até o momento não tomou a velocidade necessária e já sofreu cortes.
Para reverter esse cenário é imprescindível ampliar os investimentos na construção civil e incluir o pavimento de concreto como opção nas licitações de ruas e rodovias, por ser um método construtivo de maior durabilidade, mais econômico, oferecer mais conforto e segurança para os usuários e ainda exercer menor impacto ambiental.
No cenário externo, a escalada do dólar gera incertezas para os próximos meses, provocando inflação e colocando pressão nos juros. No setor de cimento, o câmbio elevado traz uma preocupação com relação ao aumento dos custos de produção, principalmente do coque de petróleo, matéria-prima essencial na geração de energia no processo produtivo.
Para minimizar os impactos ambientais e a pressão nos preços do insumo, o uso de combustíveis alternativos nunca foi tão necessário. A atividade responsável pela transição energética substitui o combustível fóssil por resíduo industrial, comercial, doméstico e biomassas.
Dados do relatório “Panorama do Coprocessamento 2024″, recém publicado pela ABCP, mostram que a cadeia cimenteira brasileira coprocessou cerca de 3,25 milhões de toneladas de resíduos em 2023, a maior marca da série histórica. Segundo o documento, nesse mesmo ano a tecnologia evitou a emissão de aproximadamente 3,4 milhões de toneladas de dióxido de carbono (CO₂) na atmosfera em relação aos métodos mais tradicionais de produção, que envolvem o uso do coque de petróleo como combustível.
Atualmente, 32% da matriz energética do setor é composta por fontes renováveis e mais limpas. Resíduos domésticos pós-triagem continuam sendo a principal alavanca de crescimento e deverá representar quase 55% da energia do setor até 2050.
A matriz energética atual está dividida em 68% de fósseis, 18% de biomassas (cavaco, licuri, babaçu, caroço do açaí, carvão vegetal, entre outros) e 14% de resíduos (pneus inservíveis, perigosos e urbano).
Diante desse cenário, a produção de CDRU (Combustível Derivado de Resíduos Urbanos), com destinação para o uso em fornos das cimenteiras, representa uma grande oportunidade para o setor e para a sociedade como um todo. Com a substituição do coque de petróleo pelo CDRU, é possível reduzir significativamente as emissões de carbono, contribuindo para a mitigação dos impactos das mudanças climáticas. Além disso, o coprocessamento de novas fontes energéticas e renováveis nas fábricas de cimento ajuda a diminuir a quantidade de resíduos dispostos em aterros sanitários, evitando passivos ambientais e problemas de saúde pública, além de alongar a vida útil dessas estruturas.
A partir de uma forte atuação regional, a indústria do cimento está acelerando cada vez mais o desenvolvimento de CDRU no Brasil para fins de coprocessamento, seguindo como diretriz o Roadmap Tecnológico, buscando o aumento de recicláveis, encerramento dos lixões e redução da disposição em aterros.
Ainda na agenda ambiental, a indústria brasileira do cimento esteve à frente dos debates do Plano Clima como uma das referências globais pela baixa emissão no seu processo produtivo, fruto de investimentos, majoritariamente ao longo das últimas duas décadas, em matérias-primas (adições) e combustíveis alternativos, bem como na melhoria da sua eficiência energética. Vale destacar que o setor, que é carbono-intensivo e o primeiro no país a ter um Roadmap de Descarbonização, está atualizando suas bases para um Roadmap Net Zero 2050.
O setor está trabalhando junto com o governo na elaboração de metas setoriais (Plano Clima), contemplando tanto a descarbonização industrial quanto o crescimento econômico do setor para atender à demanda de infraestrutura e habitação, essenciais para o desenvolvimento socioeconômico do país. O Plano Clima será concluído e divulgado pelo Governo em 2025, ano da COP30 no Brasil.
Outro avanço do ano foi a aprovação no Congresso Nacional da legislação que cria o mercado de carbono no Brasil. O Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (SBCE) contou com ativa participação da indústria brasileira do cimento. Pontos fundamentais para o setor produtivo foram incorporados, como: o modelo cap and trade, seguindo as melhores práticas internacionais e os princípios de proporcionalidade, gradualidade, medição, compatibilidade, compensações e reciclagem de receitas.
Prevalecem, entretanto, dois pontos de melhoria defendidos pelo setor industrial e que não foram plenamente atendidos. O primeiro deles é o de governança com os setores regulados integrando instância apenas consultiva (Comitê Consultivo) e concentrando todas as deliberações no Governo (Comitê Deliberativo). Além disso, as multas e penalidades atreladas ao faturamento da empresa (limitado a até 3%) podem gerar distorções preocupantes, uma vez que não há, tecnicamente falando, correlação entre emissões de GEE e faturamento.
A Nova Indústria Brasil (NIB) foi lançada em 2024 pelo governo com missões específicas voltadas à neoindustrialização do país. Uma delas, a Missão 5, contempla Descarbonização, Transição Energética e Bioeconomia. Nesse sentido, a inclusão do setor de cimento com destaque na Missão 5 representa marco fundamental para o fortalecimento da integração entre o desenvolvimento socioeconômico e a redução das emissões de gases de efeito estufa (GEE).
No entanto, o êxito da descarbonização, como acontece nas principais economias do mundo, se dará a partir da conjugação de esforços entre o setor industrial, o governo, a academia e a sociedade.